sexta-feira, 16 de abril de 2010

A "verdadeira" democracia segundo Louçã - mentiras e tontarias

Francisco Louçã debitou ontem na entrevista a Judite de Sousa na RTP1 que o PSD queria arrastar o PS no acerto para "falsear a democracia" (a dele, presumo) através da introdução de círculos uninominais na eleição para a AR, o que levaria ambos a ganhar eleições na secretaria, tal como, pasme-se, "aconteçe na Inglaterra". Eu que até não defendo os círculos uninominais fiquei, ou nem tanto, surpreso com tamanha tontaria. Fora do debate académico (onde o assunto se problematiza com seriedade) já ouvi de tudo relativamente aos círculos uninominais. Mas esta de as democracias que usam os círculos uninominais (seja em sistema mairitário, como a Inglaterra e a França, seja em sistemas mistos de pendor maioritário ou proporcional, como a Alemanha, entre muitos outros países) serem falsas democracias é uma desconcertante tontaria. Os sistemas eleitorais maioritários estão na base do nascimento e consolidação de muitas democracias com as quais temos muito que aprender (incluindo o Doutor Louçã) e não há evidência empírica que relacione este tipo de círculos a "regimes democráticos falsos". Não vale a pena avançar muito mais no assunto. Mentiras e tontarias não merecem tanto.

terça-feira, 13 de abril de 2010

Nascimento Rodrigues. Homenagem a um cidadão exemplar

Na altura da polémica sobre a substituição do Provedor de Justiça, tive oportunidade de escrever que Nascimento Rodrigues era um cidadão exemplar. Cabe-me, agora, expressar a homenagem a um verdadeiro homocívicus da nossa democracia. Tive a possibilidade de trabalhar com ele quando realizei um estudo sobre o "exercicio do direito de queixa como forma de participação política - o caso do provedor de justiça" que foi editado pela Provedoria de Justiça. Marcou-me profundamente o seu sentido de justiça, o rigor, a exigência (consigo e com os outros), e uma disponibilidade sem igual. Fiquei particularmente sensibilizado com a forma como se entregou ao exercício do cargo de provedor. Entregou-se de forma total, do mesmo modo como viveu enquanto cidadão. A democracia portuguesa perdeu um verdadeiro homocívicus.

sábado, 20 de março de 2010

Lapso meu

Afirmei ontem que não tinha visto políticos e governantes envolvidos na operação "limpar Portugal". Enganei-me. Afinal o Presidente da República participou, em Sintra, na limpeza de um pinhal, acompanhado pelo presidente da edilidade. Foram os únicos. Os restantes preferem pedir aos cidadãos que participem na vida cívica e política. Mas quando a sociedade lhes pede um empenho extra (nem que seja simbólico), raramente estão disponíveis para o dar.

sexta-feira, 19 de março de 2010

"Limpar Portugal" - um exemplo de cidadania

Num tempo onde rareia o envolvimento do cidadão na res-pública, eis um excelente exemplo das possibilidades por onde pode passar a intervenção cívica. A iniciativa "limpar Portugal" demonstra que é possivel mobilizar os cidadãos para ajudar a minimizar problemas que são de todos mas que, como é o caso, resultam em boa parte da incuria das mais diversas estruturas de governo. Está de parabéns a organização, todas as instituições apoiantes e ainda mais os cidadãos que responderam à chamada cívica. Não vi nenhum político, nem partido, envolver-se na iniciativa. É pena. Talvez pudessem aprender como mobilizar os cidadãos para a participação política.

domingo, 14 de março de 2010

A via errática do PSD

A aprovação no último congresso do PSD da proposta de penalização dos filiados que critiquem as opções da direcção a sessenta dias de eleições, marca uma via errática no PSD. A "lei da rolha", como já lhe chamam, é paradigmática de uma deriva no partido instigada por quem se dá mal com a democracia interna dos partidos ou mesmo por quem julga que a opinião critica pode ser suspensa por sessenta dias. Eis um péssimo exemplo para a coesão do PSD, para a sua abertura à sociedade, para a sua atracção ao novos filiados, para o incentivo ao activismo. Em qualquer democracia, há sempre quem se dê mal com a história ou, pelo menos, com a "sua história". Val mal democracia quanto um partido fundador da nossa democracia trata a "sua democracia" com auto-asfixia. Lamentável....
PS. Tentei confirmar no site do PSD (hoje às 17h.) o texto da proposta aprovada. Inexplicavelmente, nada constava sobre o congresso de Mafra.

quarta-feira, 10 de março de 2010

Lei da Paridade não penaliza partidos incumpridores

Escrevi ontem que a quota de 33% de mulheres a que os partidos estão obrigados a incluir, em lugares elegíveis nas suas listas não foi cumprida na última eleição para a AR, deixando a dúvida sobre a penalização dos partidos incumpridores.
Alertou-me, e bem, o jornalista Nuno Guedes (atento a estas matérias e ao rigor com que devem ser tratadas) que a penalização só ocorre caso os partidos não cumpram os requisitos legais na altura da composição das listas de candidatura. É verdade, e aqui fica a correcção. Aproveito as notas do Nuno Guedes para mostrar "mais uma" incongruência substantiva da famosa "lei da paridade a um terço". Exigindo a lei que os partidos incluam 33% de mulheres em lugares elegíveis, presume-se que o efeito pretendido é que, após a eleição, os grupos parlamentares tenham 33% de mulheres. Ora, se os partidos cumprem a lei no momento das candidaturas, e no final resultam menos mulheres eleitas, algum ser estranho usurpa a diferença. Esse ser estranho é o sistema eleitoral que, com os seus limiares de inclusão e de exclusão, elimina, em alguns círculos eleitorais, candidatas colocadas em lugares elegíveis. Será sempre assim se os partidos não aumentarem a quota de mulheres nas listas para compensar os efeitos mecânicos do sistema eleitoral. Portanto, a lei, vista exclusivamente neste plano, é simultaneamente um instrumento de expansão e de retração da participação das mulheres na vida política. Eis um paradoxo tipico de quem trata da imagem e não da substância.
Para terminar deixo os resultados da percentagem de mulheres eleitas em 2009 para a AR, por partido, apurados pelo Nuno Guedes. Ironia, ou nem tanto, o principal mentor e autor da Lei ficou bastante abaixo da "paridade" apregoada.
PS.......28,9%
PSD....27,2%
PP......19,0%
BE......37,5%
CDU...20,0%
Total..27,4%

terça-feira, 9 de março de 2010

As mulheres na Assembleia da República

Comemorou-se ontem o Dia Mundidal da Mulher. Como é próprio, neste dia, surgem indicadores variados sobre a participação das mulheres em várias áreas da vida política e social. Com curiosidade foi ver em que medida os partidos cumpriram o requisito de colocar em lugares elegíveis nas listas par a AR, 33% de mulheres. Não cumpriram. A percentagem de mulheres eleitas é de 26%. É certo que este indicador só cobre a dimensão estática do fenómeno, mas revela que nem com a pressão da lei "da paridade" os partidos cumpriram aquela exigência. Veremos se são penalizados (os que não cumpriram), como a lei exige.
Nunca defendi, nem defendo, a lei da paridade. Os resultados confirmam (e outros que podiamos aqui aduzir) que a questão da participação (pelo menos a substantiva e verdadeira) das mulheres na vida política e partidária não se resolve pela via legal.

domingo, 7 de março de 2010

De que serve o Congresso do PSD em Mafra

Qual é a utilidade substantiva do próximo Congresso do PSD em Mafra?
Estimular o surgimento de candidatos à liderança? Não me parece. Os actuais candidatos surgiram há muito tempo (um há dois anos, os outros há três meses) e num contexto muito diferente. Duvido que outros candidatos surjam no dito congresso. Seria ilógico com os requisitos solicitados a algumas das candidaturas (pelo menos às mais sérias) e traduziria mais uma das dimensões erráticas da lógica de conquista do poder no PSD.
Constituir um espaço privilegiado de debate da estratégia do partido? Não me parece que um partido estruturante da democracia portuguesa possa aceitar que um Congresso (com cinco ou seis horas destinadas a intervenções de natureza política) seja o terreno privilegiado para debater, seriamente, o seu papel como alternativa do governo do país. Um partido que durante 15 anos revelou grandes dificuldades em reflectir sobre si mesmo e sobre esse papel, dificilmente curará em seis horas o que não curou em 15 anos.
Possibilitar que os actuais candidatos apresentem ao partido (representado por cerca de 800 delegados) as suas ideias? Seria ofensivo acreditar nisto. As campanhas internas (desde que há partidos e mesmo em congressos electivos) têm outra natureza, outros modos e outros códigos.
Tratar de modificações estatutárias? Seria risível que num processo de luta pela liderança do partido, em eleições directas, um congresso trata-se de alguns dos aspectos da regulação da máquina, quando se assistiu recentemente à incapacidade de o partido fazer funcionar a comissão de revisão (estruturante) dos estatutos.
Então para que serve? Não cumprindo nenhuma das funções anteriores (nem a de aclamação ou a de celebração), dificilmente poderá corresponder aos objectivos e interesses de quem lutou para o convocar. Mas temo, essencialmente, que sirva de pouco ao partido.