sexta-feira, 3 de julho de 2009

O regresso à medicina uninominal


Foi hoje divulgado um estudo realizado pela Sedes sobre a qualidade da democracia portuguesa. Na sequência de algumas conclusões (esperadas) que já vinham tituladas em outros estudos, eis que surgiram vozes a reclamar a rapidíssima reforma do sistema eleitoral para a Assembleia da República introduzindo círculos uninominais. Seria, para certas vozes menos dadas ao estudo aturado destas matérias (custa muito...), a salvação do problema da "crescente distância" entre eleitores e eleitos. Sou determinantemente contra a introdução de círculos uninominais no nosso sistema eleitoral. As razões são muitas e, prometo, tratarei delas neste espaço. Da primeira tratamos hoje e prende-se com a facilidade com que se atribuem propriedades curativas dos males da nossa democracia a um elemento (um simples elemento) do sistema eleitoral como é o da reorganização dos círculos de votação e, eventualmente, da estrutura do voto. Há uma espécie de irresponsabilidade recorrente entre os defensores desta modificação. Teimam, teimosamente, numa solução que recusam compreender. E teimam, ainda mais, em reconhecer que as regras do jogo (mesmo que sejam as eleitorais) pouco ou nada têm a ver com a qualidade da democracia.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

prometemos voltar em breve

Vidas académicas muito intensas (demasiado intensas...) não têm dado tempo à pena destinada ao blogue. O "país intermitente" até clama pela dita pena, agora mais acicatada pela novela das "loiras do regime". Prometemos voltar em breve.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

O que o PSD não ganhou



O PS teve tudo para perder as eleições para o Parlamento Europeu. Perdeu. Até Vital Moreira ajudou!... O PSD teve tudo para as ganhar. Ganhou. O que o PSD ganhou? Ganhou a recapitalização do partido e com ela o reforço da liderança. Amorteceu muito as expectativas dos pretendentes ao lugar da actual presidente. E, sobretudo, começou a dar razão à mensgem "nunca baixamos os braços". De um partido quase definhado pode agora começar a levantar os braços. Mas a tarefa que tem pela frente não é fácil. Não é fácil encontrar um substituto para Rangel. A competição entre Manuel F. Leite e Sócrates não a mesma que entre Vital e Rangel. Tem que encontrar e crediblizar um alternativa de governo. Precisa de muito mais do que o apoio da JSD para revitalizar a "máquina laranja". Precisa, enfim, de voltar a ser um partido responsável. Tudo isto, e outras valências, ainda carecem de ser demonstradas. Que que não baixe os braços para as obter.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Que se decrete o dia mundial contra a abstenção



A União Europeia foi acordada, a poucos dias das eleições para o Parlamento Europeu, pelo fantasma da abstenção. Ao temor da grande desgraça reagiram com a chamada de figuras públicas (incluindo as do desporto e com ele o "nosso" Figo) para solenemente declararem que as massas devem, como eles, votar. Os principais candidatos portugueses comungaram do chamamento dos prescritores da Europa votante. Uns, como Rangel, enraizaram a abstenção em dimensões estruturantes. Outros, porventura menos dados ao estudo da sociologia eleitoral, debitaram as justificações de circunstância: os políticos - como eles - têm culpas porque não cumprem o que prometem; facilmente esquecem o que declaram nos panfletos; etc. etc.
As democracias ganharam um novo ritual. Uma nova lei de ferro começa a escrever-se. No tempo curto de cada eleição, as instituições e os actores políticos despertam, com o mesmo espanto e com os mesmos remédios, para o fantasma que ajudam a criar. Em cada ciclo eleitoral, prometem as mesmas curas de efeito imediato para a abstenção. Arrisco mesmo que em breve assistiremos à emissão de um decreto (bem redigido, com vígulas e outras pontuações) que declare o dia mundial contra a abstenção. Confesso que ainda não consegui compreender esta intermitência da democracia. Talvez o "nosso" Figo me ajude a esclarecer esta minha perplexidade.

quarta-feira, 27 de maio de 2009

A levitação de Dias Loureiro



Pareceu-me, logo quando o caso surgiu nos media, insustentável a continuidade de Dias Loureiro no Conselho de Estado. A esfera da ética (na política da política ou na política dos negócios) fora ferida a ponto de justificar um afastamento (por iniciativa do próprio) do cargo. Dias Loureiro não resistiu à conhecida e recorrente arma do Estado Direito, como se no Estado só existisse Direito, em nome da exclusão da prévia condenação sem culpa. O Presidente da República, preso ao Direito que o Estado cria, circunscreveu o caso ao direito e à palavra de honra, fechando um círculo dentro de um quadrado. Foi neste "círculo quadrado" (direito e honra) que Dias Loureiro levitou durante muito tempo, sem compreender que o mundo onde circula tem mais círculos do que os do Direito e mais quadrados do que os da palavra de honra. Se o que se conhecia era já bastante, o que se tem vindo a conhecer não deixa dúvidas quanto à insustentabilidade da sua continuidade no cargo de conselheiro de estado. Vai muito mal o Estado que assim se aconselha. Vai mal a democracia que assim se governa. Vai mal a política que assim se afirma. Espero que a levitação de Dias Loureiro não demore muito.

terça-feira, 26 de maio de 2009

Há esperança para os "Partidos-Movimento"?



Há uma certa dose de esperança na capacidade de os dois "partidos-movimento" (MEP e MMS) candidatos, por agora, às eleições para o Parlamento Europeu disputarem o espaço de representação política aos partidos tradicionais. Do ponto de vista das possibilidades de representação, estas eleições são as que mais podem favorecer a entrada destes novos actores no espaço político institucionalizado: círculo nacional único; ausência de cláusula barreira formal (embora com limiar efectivo de 3,2%). No entanto, um dos problemas cardeais que se coloca a estes movimentos, sobretudo em sociedades mediáticas e com fraca densidade participativa, é o de ultrapassar o teste da maturidade. Se é fácil ganhar o terreno dos media, o mesmo já não aconteçe quando é necessário vencer os terrenos da sustentabilidade organizacional, da consolidação de lideranças, do aprumo programático-ideológico, da inevitabilidade das hierarquias, entre outras valências vitais à sobrevivência das organizações políticas. É porque aqui que muitos movimentos iniciam (ou nem sequer chegam a iniciar) o caminho para a esclerose e consequente definhamento (ex: Partido da Solidariedade Nacional, Partido da Gente, par referir alguns).
A moderna "democracia de opinião" tende a atribuir, de forma acelerada, capital mediático a movimentos deste tipo, exagerando-lhe, em regra, as potencialidades. Facilmente nos esquecemos que a renovação estrutural dos actores políticos precisa mais do que democracia de opinião. Por exemplo, precisa de mais cidadania activa, coisa que é escassa e de difícil construção. Os partidos tradicionais contribuem pouco para este labor e os media não lhe ficam atrás.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Paulo Rangel e a nova teoria da representação política



Qual é a primeira medida que Paulo Rangel vai apresentar em Bruxelas? Disse o próprio ao Sol desta semana: «repartir o número de municípios em função dos deputados eleitos, para que cada um fique com uma região, para assegurar a ligação directa com o território nacional. Os eurodeputados representam bem o interesse nacional em Bruxelas, mas o retorno nalguns casos não é evidente». É, para mim, uma proposta inintelegível. De que lógica de representação política fala Rangel? De uma nova teoria que casa o modelo de delegação com o modelo fiduciário, aplicando o primeiro às fronteiras de uma região nacional e o segundo à defesa dos interesses nacionais na Europa. Esquisito. Muito esquisito. Não compreendo como é possível casar dois modelos incompatíveis. Estará Rangel a falar do modelo político da representação, em que os políticos adaptam a ideia de representação consoante o desejo de conquista do voto? Estou mais certo disto. E com que critérios fará Rangel a divisão das regiões? Será que o modelo só se aplica aos deputados eleitos pelo PSD? Como assegurarão eles a ligação pretendida com o território nacional? Como se avalia o retorno da acção dos eurodeputados?
Talvez Rangel se esqueça que nas eleições europeias elegemos eurodeputados e não deputados de uma qualquer região do país para nos representar em Bruxelas. Talvez Rangel se esqueça que à representação política não convém a fracção. Convém o todo e não para a parte. Talvez Rangel se esqueça que propostas desta natureza não basta fazê-las. É preciso explicá-las. Talvez, por isso, se tenha recusado a explicar aos eleitores o Tratado de Lisboa. Seria demasiado maçador. Não daria votos como poderá dar uma proposta revolucionária de uma nova teoria da representação política. É por estas e por outras que "não assino por baixo".

sábado, 16 de maio de 2009

Manuel Alegre e a "democracia invisível"



A democracia têm, como é próprio da sua natureza, um lado invisível. Trata-se do conhecido conceito do "silêncio do poder". Uma boa parte da acção política esconde decisões cujos contornos não são penetráveis. O próprio conceito de democracia (mesmo que amplifiquemos o seu sentido lado) não reserva grandes activos em matéria de transparência. Os gregos, da era clássica, anteciparam a tempo esta natural deficiência da democracia. As decisões "democráticas" tomadas no Ágora resultavam de complexos processos de manipulação que a oratória escondia sabiamente. Pouco ou nada se conhecia, assim os decisores o decidissem, do que realmente estava em jogo. Terá sido por isso que Rousseau não recomendou a democracia aos homens, nem que fosse feita debaixo de um carvalho. Reservou-a aos deuses. Talvez os deuses se soubessem governar democraticamente.
Há um lado estranhamente invisível no tempo, no contexto e na substância do anúncio de Manuel Alegre sobre a sua maturada e solitária decisão em continuar no PS e de não aceitar integrar as listas do partido às eleições para a Assembleia da República. O tempo é estranho (no exacto dia que Sócrates visitou a ilha de Jardim). A solitude é ainda mais estranha. Uma decisão desta natureza é sempre relacional (o tempo, a caça ou a pesca não alimentaram, de certo, as conversas com Sócrates). Quanto à substância logo veremos. Eis a parte invisível que já começou a abrir fendas (vejam-se algumas notícias de hoje que referem que Alegre nega ter negociado lugares nas listas à AR). Sabendo que é quase impossível o acesso aos "secret gardens" do recrutamento parlamentar, estarei atento às listas do PS para a Assembleia da República. Estarei de alerta ao tempo que Alegre dedicará à "democracia que não se esgota nos partidos". Esperarei, atentamente, como se vai urdir a configuração das candidaturas às eleições presidenciais de 2011. Veremos, em breve, se a Alegre "ninguém o cala" ou se, como Péricles, subscreve a teoria dos discursos fúnebres. Para ele e para a democracia.

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Lembrei-me de Daniel Campelo

Declarou hoje na SIC Notícias o deputado do PS destinado à defesa das indefensáveis alterações à lei do financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais. No meio da sessão disse: reduzimos a opacidade, aumentámos a transparência, não há dinheiro vivo. Reconheço que se gasta de mais nas campanhas, apelo aos partidos para gastarem menos. E acrescentou: provavelmente as subvenções públicas são muito elevadas. Espantoso. Após um ano de intensos debates e de profundo estudo (segundo o deputado) fez-se de tudo para aumentar a transparência. Mas não houve tempo para tratar do essencial.
Ao acompanhar este lamentável processo lembrei-me de Daniel Campelo. Há uns anos, a classe política portuguesa, analistas, articulistas, comentadores, comentadores de comentadores, entre outros mestres do discurso mediático ficaram incomodados com o voto "consciente" do dr. Campelo a propósito da aprovação do OE de 2001 (era Guterres). Para eles, era a derrocada da democracia, qual pecado mortal que a mataria se o acto fosse repetido por ele ou seguido por autarcas a meio tempo ou por outros de idêntica espécie. Alegres, na altura, ficou o primeiro-ministro e os seus seguidores directos, afirmando ter sido um acto de coragem e de salvação do bem comum, pois a sobrevivência da Nação sem duodécimos fora garantida.
O discurso do defensor oficial do PS da nova legislação sobre o financiamento dos partidos e das campanhas recorre aos mesmos argumentos. Pela sua prosa, a nova lei constitui um passo de gigante no cumprimento do grande desígnio: a transparência. Trata-se, também, de um acto salvador da democracia.
O tempo e o contexto deste processo, os efeitos do que se aprovou e, sobretudo o que não se quis aprovar, revelam o que há de pior no jogo partidário. Para lá dos efeitos, que o tempo se encarregará de mostrar, deixaram uma péssima imagem do Parlamento e abalaram a já débil consideração que os portugueses têm pela sua classe política.
Regressando ao dr. Campelo, creio que a democracia sobrevive muito melhor a "pecadilhos" como os dele do que sobreviverá a actos de salvação democrática como este que os partidos nos querem "vender".

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Que o Presidente vete a estatocracia

Já escrevi. Já afirmei à imprensa. A recente paródia legislativa sobre o financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais é das piores paródias parlamentares da nossa democracia. Os partidos (todos) ajustaram num dos muitos quadrados sepulcrais (os gabinetes inacessíveis da "casa da democracia") mais uma lei que mantém e reforça a estatocracia. Do acerto resultou uma nova porta, sem controlo, para o dinheiro privado. À critica dos criticos certeiros e à agudeza de alguma sociedade civil que detestam nestes casos, os partidos (os que se deram ao trabalho de orar sobre o assunto) disseram que o "povo crítico" não estudou a matéria. Logo esqueceram o assunto e, de repente, lembraram-se que as campanhas eleitorais (de tanta contribuição estatal combinada com a receita privada) podiam dar lucro. Eis uma lembrança própria de alunos que sempre mandaram às urtigas não a matéria, mas a essência da matéria. É que as campanhas já deram lucro. Em 2001, António Abreu e Jorge Sampaio obtiveram saldos positivos nas respectivas campanhas para a presidência da república e na legislação de 2003 esta possibilidade foi ainda mais evidente. Em face de tão profunda reflexão decidiram alterar uma lei que ainda nem sequer foi promulgada. Que as sobras fiquem reservadas ao seu destino. Nem mais. Eis uma democracia que encontrou um fundo de reserva para gastos eleitorais. Ficamos sem saber se esse eventual fundo benefícia de juros à uma qualquer taxa euribor.
Esta legislação já era pessíma. Pior ficou. Com ela ficam pior os partidos. Ficará muito pior a república se o Presidente não lembrar que a estatocracia é o mais terrivel inimigo da democracia. Deve vetar esta lei.

terça-feira, 12 de maio de 2009

A vertigem legiferante dos partidos



Espanto. Ou nem tanto. Segundo a imprensa, os partidos (ao que julgo o PS e o PSD) já estarão disponíveis para alteração à lei do financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais que aprovaram há menos de dez dias e que ainda não foi promulgada pelo Presidente da República (PR). Confesso que já estava habituado à vertigem legiferante que, desde 1993, tem marcado a aprovação desta legislação. Nunca, nenhuma lei, foi objecto de ampla maturação. Nunca, nenhuma lei foi antecipadamente escrutinada por especialistas para evitar falhas graves, esquecimentos e outras omissões. Até se entende. Os partidos, nestas matérias, têm os seus próprios especialistas que acordam no segredo dos gabinetes as melhores soluções para satisfazer interesses conjunturais. O que nunca vimos foi a situação que se avizinha: os partidos, em face das reacções mortiferas que receberam em relação aos efeitos da lei recentemente aprovada, declaram, em surdina, que estão dispostos a rever o que aprovaram e defenderam, assim o PR não aceite o diploma.
Há quem afirme que a democracia portuguesa padece de doença grave. É verdade. Tão verdade que lhe conhecemos as maleitas e, em boa parte, quem lhe dá o nome.

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Eleições europeias e partidos de cartel



Um dos indicadores da cartelização dos partidos é o do grau em que o seu funcionamento corrente e eleitoral depende do Estado. Este indicador pode analisar-se a partir da legislação sobre o financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais. No caso português, os dados revelam uma crescente dependência dos partidos do Estado, facto que indica uma crescente descapitalização das ligações destes actores à sociedade. Eis alguns dados:
A) Na próxima legislatura o Estado contribuirá com cerca de 10 milhões de euros para encargos de assessoria aos deputados;
B) Também, na próxima legislatura, o Estado contribuirá com cerca de 70 milhões de euros para financiamento à actividade corrente dos partidos (3.15 euros por voto obtido na mais recente eleição legislativa - estimo 5,5 milhões de votos úteis para o efeito e o valor base de 135/IAS de 426 euros);
C) Em média, as subvenções públicas às campanhas eleitorais (considerando a década actual) são suportadas em 70% por verbas públicas. Como exemplo, para as próximos eleições europeias os cinco partidos representados na AR estimam cobrir as suas despesas, em 78%, com verbas públicas. Este é o valor médio resultante dos orçamentos apresentados ao Tribunal Constitucional. Segundo esses orçamentos, as despesas do PS serão cobertas em 93% por subvenções públicas; as do CDS em 90%; as do BE em 81%; as do PSD em 68% e as do PCP em 58% (o rácio para o PCP ajuda a compreender muito do que se passou com a aprovação das recentes alterações à lei do financiamento partidário).
Estes dados atestam o que já sabiamos. Cada vez mais os partidos são máquinas de cartelização estadual. Serão, cada vez menos, estruturas de ligação dos cidadãos à política e organizações de representação social ou ideológica. Bryce, Ostrogorski, Michels, e tantos outros, bem anteciparam esta mudança.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Financiamento partidário - uma das piores leis da nossa democracia



A legislação sobre o financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais é, seguramente, das piores leis da nossa democracia. Falamos na lei, mas tivémos, entre 2003 e 2009, sete leis sobre a matéria e outras tantas tentativas de alterações a que acrescem algumas modificações de pormenor. Lembro a fastidiosa sequência de leis: 72/93; 27/95; 56/98; 23/00; 19/03; xx/09 (ainda não sei o número da que foi recentemente aprovada). Não refiro, as tentativas de modificação e as pequenas emendas de circunstância. Seria muito mais fastidioso. Nesta matéria somos um exemplo acabado de um experimentalismo deprimente. A vertigem legiferante ilustra que ora se labora em cima do joelho, ora se reage cegamente a suspeições reais ou imaginárias sobre financiamentos ilícitos, ora se esqueçe o que tão facilmente pode ser lembrado se bem estudado.
A recente alteração legislativa é um retrocesso brutal no que respeita à transparência da actividade partidária que é financiada largamente pelos nossos impostos. Não só porque permite a circulação de "dinheiro vivo" como porque aceita (tenho que ver melhor a lei) a possibilidade de financiamentos indirectos. A lei foi aprovada por quase unanimidade (teve um voto contra: o do esclarecido deputado António José Seguro) o que prova que, tal como no passado, esta matéria é objecto de amplo consenso quando se trata de acomodar as pretensões de todos os partidos. Um exemplo claro de que na democracia portuguesa não há só espaço para blocos centrais de interesses. Também há espaço para blocos globais de interesses.
PS. Como tenho dedicado muito da minha investigação académica a esta matéria voltarei ao tema. Há dados muito interessantes.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

O cinzentismo do PSD (II)



Continua cinzento o PSD. Agora um pouco mais carregado do que me pareceu quando surgiu, há umas semanas, em cartaz a "Política de Verdade".
Ao cizentismo acresce agora a frase multissémica "NÃO DESISTA. SOMOS TODOS PRECISOS". O comum dos mortais terá que consultar um bom manual de semiologia para descodificar o sentido e o destinatário da mensagem. Sabemos a fonte, conhecemos o código e identificamos o meio. Mas não discernimos (pelo menos eu) o sentido da mensagem nem o seu destinatário. Poderiamos dizer que não se completa o processo de comunicação. Errado. Completa-se de forma enviesada, porque não obedece a elementares princípios de eficácia da comunicação. É por isso que temos assitido a interpretações para todos os gostos (entre o sério, o caricatural e o ofensivo).
O plano de comunicação do partido e de MFL parece consolidar, cada vez mais, um idioleto. Um estilo imagético do PSD marcado por uma vertente intelegível e por outra vertente indecifrável. É caso para sugerir que o slogan "política de verdade" seja alterado para "política de meia-verdade".

quinta-feira, 30 de abril de 2009

Quando vale um "recado" do Presidente

Cavaco Silva pediu que os partidos que não exagerassem nas despesas eleitorais nas próximas campanhas. Pediu bem. Os valores destas despesas (as declaradas) aumentaram de forma muito significativa após a mudança do paradigma de financiamento dos partidos e das campanhas, que passou, em 2003, de misto para público. Em média, na última década, cerca de 70% das despesas eleitorais são suportadas pelos impostos.
Que influência teve o pedido do Presidente? Veremos. Temo que pouca ou nenhuma. Pelos valores dos orçamentos de campanha para a eleição ao PE, o conjunto dos partidos prevê gastar quase 8 milhões de euros (o orçamento dos cinco maiores partidos atinge os 6,7 milhões de euros). Ora este valor é cerca de 80% superior ao total das despesas eleitorais dos partidos registadas na eleição para o PE de 2004. O Presidente pede moderação. Os partidos sobem a parada para quase o dobro.
Afinal quanto vale o "recado" do Presidente?. Vale pouco. Isto porque mesmo que os partidos só gastassem o valor previsto nas subvenções públicas para a campanha ao PE (4,3 milhões de euros) já seria muito mais do que foi dispendido em 2004. Como não se espera que o façam, o recado do Presidente de pouco ou nada vai valer. Isto porque o recado devia ir para a revisão (séria) do modelo de financiamento dos partidos e das campanhas.

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Telefones grátis de cor laranja, ou rosa, ou azul

Tal como a generalidade das democracias consolidadas também a nossa democracia acompanha os ritos e os ritmos da chegada avassaladora da "democracia de opinião". Uma das mais recentes construções do edifício democrático, na linha de B. Manin (The Principles of Representative Government, Cambridge University Press, 1997) é a da grande capacidade que as democracias têm para ouvir a "voz dos cidadãos". São democracias apuradas na técnica da audição pública. Usam bem o produto das ciências da comunicação e das tecnologias da informação. Testam diariamente as andanças da governação. Com regularidade solar, e sem tempo para a reflexão, ouvem e escutam os clamores dos cidadãos quase maquinalmente.
A nossa democracia não foge à regra. Nunca como hoje se prestou tanta atenção à audição dos cidadãos. Várias iniciativas da sociedade civil (só para exemplificar) têm produzido ultimamente relatórios dessas audições, nas quais os cidadãos expressam os seus anseios, angústias, preferências...enfim o que lhes vai na alma. A classe política recebe com agrado o produto e promete religiosamente ouvir o que foi ouvido, tratar do que ainda não foi tratado, curar o que precisa de ser curado. Já abundam as linhas telefónicas grátis, de cor laranja, ou rosa ou azul. Todos prometem ouvir: - deixe o seu recado, o seu problema, a sua solução.
O dilema da "democracia de audiência" começa aqui. É que esta democracia encontra-se, como nunca, capacitada para ouvir mas não está preparada (nem foi concebida) para incorporar, na mesma escala, o produto da audição. E quanto mais ouve menos consegue responder.
Eis um paradoxo que é necessário compreender, sob pena de estarmos a construir mais uma nova miragem no já complexo mundo da relação entre os cidadãos e os governantes. E as consequências são imprevisíveis.

domingo, 26 de abril de 2009

A liberdade: da individualidade como elemento do bem-estar



Comemorou-se ontem o 35.º aniversário do 25 de Abril e, com ele, um dos seus legados cardeais: a liberdade. Como os "antigos" bem ensinaram, a liberdade não é só algo que se conquista. Deve-se aprender, praticar e respeitar. Eis algo que muitos "modernos" ainda não incorporaram na sua conduta. Porque é sempre bom recuperarmos as reflexões dos "antigos", recomendo hoje a leitura do ensaio de John Stuart Mill, "On Liberty", em particular o capítulo III (Of individuality, as One of the Elements of Well-Being). A edição da Penguin Books de 1985 é uma boa referência, já que recupera a edição original de 1859. Há algumas edições em português, mas recomendo a versão inglesa (julgo que está disponível pela Livraria Bulhosa). Estou certo que há ainda muito a aprender com Stuart Mill.

sábado, 25 de abril de 2009

As lágrimas da nossa democracia

Já escrevi, há uns dias, sobre as intermitências da nossa democracia em http://homocivicus.blogspot.com/2009/04/elefantes-bebidas-energeticas-e-sms.html. Volto hoje a tema paralelo, a propósito do recente debate que se gerou sobre os resultados da sondagem da Eurosondagem sobre a relação dos portugueses com a sua democracia e com os seus partidos. Uns dias antes, a Visão deu conta dos resultados do projecto "Portugal de Todos" entregando às entidades oficiais da nação a síntese das sugestões dos cidadãos. Em comum, os dois acontecimentos, revelam que os cidadãos estão descontentes com a sua democracia, não se revêem nos partidos, querem candidatos independentes ao parlamento, etc., etc. Numa síntese, a nossa democracia está doente e verte lágrimas para que a curem.
Quais foram os efeitos da divulgação destes factos?. O esperado. Uma espécie de surpresa colectiva perante as evidências. Debates sobre a qualidade da democracia, prosas e mais prosas com remédios diversos para as ditas maleitas, noticias a registar para a História que os partidos estão "no fundo 35 anos depois". O país foi surpreendido. É preciso agir rapidamente sob pena de abalo císmico grave, defenderam alguns.
Ora, não disto é surpresa. Desde há muitas décadas que os académicos têm investigado os caminhos na nossa democracia. Sabe-se, desde há muito, o que se passa com a relação dos cidadãos portugueses com o seu regime, as suas instituições e os seus actores. Sabe-se, desde há muito, o que se passa ao nível das atitudes e comportamentos eleitorais; ao nível das práticas participativas; ao nível das forças e fraquezas da sociedade civil. Sabe-se, desde há muito, das insuficiências do nosso sistema eleitoral em matéria de qualidade da representação. Sabe-se, desde há muito, muito mais sobre as limitações, insuficiências e excrescências da democracia portuguesa. E também sabemos que o que se soube e se sabe (cientificamente) fraca ou nula utilidade teve.
O que há de novo nas reacções aos dados que referimos acima? Nada. As mesmas lágrimas de sempre, a mesma surpresa sobre os factos. Não deixa de ser fascinante a recorrente surpresa que assalta os homens sempre que se repete o que já sabemos, o que já concluímos, o que já vimos.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Os "independentes" e a salvação da democracia portuguesa



Parece estar encontrada a via de salvação da democracia portuguesa. Manuel Alegre tem reclamado a possibilidade de candidaturas independentes à Assembleia da República. Para ele, será uma excelente fórmula para regenerar os partidos e, com eles, a nossa democracia. De vez em quando surgem miragens deste tipo. Propostas de fórmulas salvifícas das degenerências da partidocracia sem reclamar remédio verdadeiro para a doença. Durante 25 anos discutimos (discutiram e decidiram os partidos) a abertura de candidaturas independentes às autarquias. Em 2001 e em 2005 isso já foi possível. Melhorou a democracia portuguesa? Não. Piorou, e muito. Melhoraram os partidos? Não. Pioraram, e muito. Melhorou a cidadania? Não. Independentemente das questões técnicas associadas à solução de Alegre (que são muitas e complexas) a questão substantiva a discutir é se tais candidaturas serão recomendáveis. Quanto a mim, não são. Não pela sua natureza. Não pela sua bondade normativa ou valorativa. Mas porque nunca resolverão o problema que teoricamente pretendem resolver. Nenhuma candidatura independente (mesmo que poucos saibam o que significa ou implica) tem capacidade de mudar o funcionamento de um qualquer sistema político, de um qualquer sistema de partidos, de um qualquer partido... nem que seja português. Se os partidos não decidirem renovar-se não serão estas candidaturas que os farão renovar. E se for para renovar tal como muitos dos exemplos conhecidos nas autarquias locais, então que não sejam, nunca, permitidas.

A democracia não se faz com fórmulas deste tipo. Podem "soar" bem, mas têm pouca ou nenhuma utilidade.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Jorge Miranda - um verdadeiro homo cívicus


Hannah Arendt inicia uma das suas obras de referência, "The Human Condition, 1958" com o esclarecimento da expressão vita activa. Designa três actividades fundamentais da existência humana: labor, trabalho e acção. Deixemos as duas primeiras actividades para outras notas. Fiquemos com a acção, que justifica este "post". A acção, segundo Arendt, «...na medida em que se empenha em fundar e preservar corpos políticos, cria a condição para a lembrança, ou seja, para a história». A acção respeita à dedicação, com paixão, aos assuntos públicos e políticos.
É aqui que entra Jorge Miranda e a sua disponibilidade em candidatar-se a Provedor de Justiça, apesar da lamentável trapalhada que envolve a substituição do actual provedor. Sobre o caso já disse de tudo. Não vale a pena insistir nos adjectivos com que, sobre a matéria, já se brindaram os dois maiores partidos da república.
Mesmo assim, Jorge Miranda aceita que os deputados o escolham ou o rejeitem. Sujeita-se ao escrutínio dos homens que ocupam uma sede que ele próprio ajudou a construir. Sereno como poucos, aceita, enfim, os piores vicíos do "Estado" dos nossos partidos políticos. Só um homem superior e com carácter raro aceitaria, com este grado, tais defeitos e feitios da nossa democracia. Na entrevista que hoje concedeu à SIC Notícias ficou claro que mantém a esperança que o deixem viver de forma actuosa na Provedoria de Justiça. Jorge Miranda representa, à maneira aristotélica, um bios politikos. Mesmo que não o deixem dedicar-se aos assuntos públicos a que se candidata, criou e continua a criar as condições para a lembrança, ou seja , para a História.
Quão escassos são estes homens.....E tão mal que a democracia os trata.

terça-feira, 21 de abril de 2009

A essência de uma entrevista e as voltas que um recado dá



Era esperado. Cavaco. Crise. Competição eleitoral. Os três temas que dominariam uma das mais aguardadas entrevistas de José Sócrates (hoje na RTP). Assim foi, considerando que a parte relativa ao "caso Freeport" se integra na competição eleitoral. Quanto aos dois últimos temas nada de novo. Discurso de justificação face à crise a que tardou em dar nome. Discurso de vitimização perante o espinhoso calvário (que visivelmente carrega) do caso Freeport. Juntou ao calvário a subscrição pública de uma das famosas leis da propaganda - a "lei do inimigo único" - ao soletrar bem o "nome da besta" que às sextas-feiras lhe tira o sono: a TVI. Até aqui nada de novo.
A essência da entrevista ficou marcada por uma espécie de revisitação da tese do apaziguamento ideológico ajustada à marca da "cooperação estratégica". Sócrates , em ambiente de competição eleitoral (terreno propício a excessos verbais) insurgiu-se contra a "politica do recado". O país correu a encomendar a toda a espécie de especialistas em descodificação de significados (onde me incluí) que dessem nome ao destinatário da mensagem. Por unanimidade quase todos (encontrei um descodificador compreensivelmente dissonate: José M. Júdice) lhe chamaram Cavaco Silva.
Já em seu recato (ele os seus "bons" assessores) deve ter-se dado conta dos efeitos que teria uma confrontação com o Presidente da República em início de um quadrúplo ciclo eleitoral. Preparou-se bem. Muito bem. E explicou. Não se referira ao Presidente. Dirigira-se à oposição. Essa sim que lhe faz a vida num inferno por meio de recados. Com o Presidente está tudo bem. E assim será até que os resultados das três eleições vizinhas se saibam.
Eis a essência de uma entrevista e das voltas que um recado dá.

O "Parlamento dos Murmúrios" - não há eleições europeias

O debate (se merecer o título...) de ontem no Prós e Contras, com os candidatos de cinco partidos, sobre as eleições para o Parlamento Europeu confirmou que a tese de Reif e Schmitt sobre as eleições de segunda ordem (cf. "Nine second-order national elections: a conceptual framework for the analysis of European elections results, European Journal of Political Research, 8, 1980) é de difícil confirmação.
Quem resistiu até ao fim teve, certamente, oportunidade de constatar que o debate sobre o anunciado tema não existiu. Foi, como previsto na teoria e já amplamente confirmado na prática, um exemplo de canibalização pelos temas de política nacional, onde se incluiu a também esperada chuva de ironias sobre mecanismos e processos de recrutamento político, não faltando a presença do eterno tribunal que facilmente encontra culpados pelas muitas desgraças em que nos encontramos.
De Europa pouco ou nada. De Parlamento Europeu pouco ou nada. De temas verdadeiramente ligados à "pátria europeu" nada. O debate, com o seu cenário, os seus autores e os seus actores, configurou um autêntico "parlamento dos murmúrios" (na expressão de Adrinano Moreira). A era televisiva até pode favorecer (ou não) quem fala mais alto; quem mais interrompe; quem melhores cartazes anúncia; quem mais seguidores arregimenta para que as palmas se batam. Que mais queremos? Os principais candidatos já estão eleitos. Os eleitores (os 24% ou 30% previstos) votarão. No dia das eleições carpiremos o afastamento dos cidadãos na "nossa Europa".
As eleições para o Parlamento Europeu morreram. Vivam as eleições nacionais.

sexta-feira, 17 de abril de 2009

O Dr. Luís Filipe tinha os números

Hoje na SIC-Notícias, o Dr. Luís Filipe (ex-presidente do PSD) tinha os números da contabilidade oposicionista a Ferreira Leite.
Apareceu no Agora moderno a tecer considerações sobre assuntos sobre os quais prometera silêncio. Mais um exemplo que dá razão à tese do "albergue espanhol" de Carlos Santos (CS). Recomendo leitura da peça de CS sobre o assunto em http://ovalordasideias.blogspot.com/2009/04/sociais-democratas-liberais-o-psd.html

Elefantes, bebidas energéticas e SMS - ou a cidadania intermitente




Li ontem no DN que mais de 300 mil jovens eleitores portugueses vão ser incentivados a votar no próximo ciclo eleitoral. Motivo: estes novos polites, estavam arredados do sistema (riscaram do seu mapa de preocupações a famosa trilogia: exit, voice, loyalty), por razões que as Entidades Oficiais da Nação (EON) não querem saber. Preocupadas com o facto, eis que as EON decidiram, por unanimidade, recensear automaticamente as "ovelhas tresmalhadas". Assim, fica a contabilidade em dia. Depois começaram a surgir as dúvidas. E se estes polites mandarem às urtigas os seus deveres de comparência às urnas?
Solução: incentivar-lhe a deslocação para o acto via SMS. Sempre ficam a saber o local da tarefa. Junta-se à receita o labor das associações de juventude que acrescentam uns concursos e talvez o projecto dê certo.
Confesso que fico pasmado (já não devia!...) com estas notícias. Conheço centenas de campanhas do mesmo tipo. A exemplo, em 2005, na Tailândia, as respectivas EON, preocupadas com o mesmo fenómeno, decidiram colocar na rua elefantes que seguravam (com a obediência própria dos elefantes) um boletim de voto na tromba e o depositavam numa urna de voto. No mesmo ano, o Conselho da Juventude Espanhol não ficou atrás. Numa campanha antiabstenção juvenil para o referendo à Constituição Europeia, compararam os seus jovens polites a símios. Nem mais. Os jovens que não votavam eram primatas que chegariam à classe dos humanos logo que cumprissem o dever (não se espantem...a campanha incluia um gráfico comparativo da inteligência de ambas as espécies... simíos e jovens não votantes tinham um QI idêntico). Para mais incetivo distribuiram aos então primatas mais de 200 mil latas de uma bebida isotónica que dava "ganas de votar". Podia lembrar iniciativas idênticas (confesso que esta dos primatas é única) efectuadas nas mais diversas democracias. Mas o objectivo do post não é este.
A democracia real tem as suas intermitências. A do apelo ao voto é uma delas. Com a regularidade dos ciclos eleitorais surge a regularidade dos democratas que querem mais democracia no momento. O mundo dos jovens é ciclicamente abalado por incentivos à deslocação ao local de voto. Pedem-lhe que seja um "cidadão maior" na altura das eleições. Mas tratam-no como um "cidadão menor" durante o resto do tempo em que os democratas se dedicam aos encantos do exercício do poder. Joseph Schumpeter (Capitalisme, Socialisme et Democratie, Paris, Payot, 1951) bem alertou para estas intermitências. Quem se der ao trabalho (ou ao regalo) de o ler, verá, ainda que nos custe, que tinha razão. Uma das intermitências da democracia, dizia, Schumpeter, é aquela em que nos momentos eleitorais os cidadãos são chamados a registar o momento sagrado da legitimação do mando. É nessa altura que a democracia se recorda dos seus cidadãos.
Pois, digo eu, vai mal a democracia que se recorda de nós de vez em quando. Vai pior a democracia que apela à cidadania de circunstância.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

As eleições e o povo semi-soberano

Já decorre o ciclo eleitoral de 2009. Como ele abrem-se (ou fecham-se) os processos de recrutamento do pessoal político que, depois de eleito, recrutará outro pessoal para seu mando ou seu apoio.
É a propósito dos mecanismos de recrutamento político que recomendo a leitura da obra "O Povo Semi-Soberano, Partidos Políticos e Recrutamento Parlamentar em Portugal", de Conceição Pequito Teixeira (Almedina, 2009). Um livro que resulta da tese de doutoramento da autora no ISCSP e que observa um fenómeno central da Ciência Política: o dos mecanismos, processos e estratégias de recrutamento parlamentar. Retiro das conclusões um excerto que resume uma boa parte das conclusões: «trata-se, pois, de uma realidade que não pode deixar de conferir aos padrões e às estratégias de recrutamento parlamentar uma natureza profundamente fechada, autoreferencial e preponderantemente partidocrática, por certo responsável pelo crescente isolamento e distanciamento da classe política em relação à sociedade civil, como se de dois mundos ou realidades à parte se tratasse».
O maior desafio consta da pergunta que a autora faz no final da sua caminhada: Se os partidos são essenciais à democracia, o que fazer para ultrapassar as suas tendências fechadas, oligárquicas e autoreferenciais através de novos métodos e estratégias de democratização?. Temo que as tendências apuradas por Conceição Teixeira se renovem neste ciclo eleitoral. A "lei de ferro da oligarquia" continuará a ser lei e R. Michels continuará a ter razão. Ele e o seu amigo (que não conheceu) Ostrogorski. Se hoje nos visitassem veriam - sem surpresa - como tinham ambos razão.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

"Nós europeus" e o fecho do "buraco negro"




Já conhecemos a mensagem central do PS de Vital Moreira nas "eleições europeias 2009" (não sei que eleições são estas). Um cartaz com brilho. O Professor sorridente. A assinatura do Professor. O nome do Professor. O slogan "nós europeus". Não conhecemos a mensagem central do PSD de Paulo Rangel. Arrisco que terá foto do "candidato-líder de bancada parlamentar laranja" com slogan "Contra a política de desilusão e engano" ou, em alternativa, "Chegou a hora da verdade".
Fiquei supreendido pela escolha de Paulo Rangel para cabeça-de-lista do PSD às tais eleições europeias 2009. Um parlamentar competente, lutador, ponderado, entre outras qualificações que fazem dele um dos melhores activos do PSD em matéria de recursos políticos (coisa que é escassa no partido). Seria de esperar que se mantivesse como reserva para o díficil combate político ao Governo e ao PS nas próximas eleições legislativas. Não se sei se manterá a linha das duplas candidaturas ou se, por opção própria, decidiu abandonar a sacrificante luta politica interna (na qual labuta muito só) para fixar residência mais calma e melhor remunerada em país menos solarengo.
Mas, a escolha de Rangel, o modo da sua apresentação como candidato (só ele) por Manuela F. Leite (MFL) e as primeiras declarações do próprio (às 20.15h ...hora esquisita ... não casa com o se conhece publicamente do pensamento de MFL sobre a importância da imagem) deixam claro duas lógicas de campanha eleitoral por parte do PS e do PSD.
A PRIMEIRA, a do PS, seguindo o pensamento de Vital Moreira, concentrará esforços no debate sobre a Europa, tentando colocar na agenda pública temas que encantam a classe política, servem os interesses de quem governa e que pouco ou nada interessam aos eleitores (pelo menos da forma como são apresentados e debatidos). Vital Moreira e o PS acarinharam o slogan "Nós europeus". Duas palavras e um sentido de difícil descodificação.
- Que mensagem quer passar às pessoas com o título "Nós Europeus"? perguntou-lhe Nuno Saraiva no DN de hoje.
- É a ideia de nós cidadãos europeus, nós como conceito político...respondeu o candidato.
Confesso que me apeteceu reler os clásssicos para perceber esta ideia de "nós como conceito político" e até voltar a Friedrich Tonnies para relembrar os conceitos de Gemeinschaft e de Gesellschaft. Não vale a pena. Percebe-se o que se quer. A cidadania europeia, a polis europeia, a comunidade política europeia, a construção europeia, serão temas centrais do debate trazido pelo PS e por VMoreira. São certamente temas muito interessantes e de escasso tratamento pois só regressam à polis portuguesa de cinco em cinco anos. Mas temo que a centragem do debate em temas desta natureza corresponda a uma estratégia política de minimização da pressão política sobre a acção governativa nas nossas fronteiras. Convenhamos que é bem visto. Veremos é se os cidadãos portugueses se comportam como "eleitores-ovelha".
A SEGUNDA, a do PSD e de Rangel é exactamente a oposta. Centrar o debate em questões internas. Ou, em alternativa (o que vai dar ao mesmo) aproveitar questões europeias com forte impacto no funcionamento da nossa vida económica e social para os esgrimir em terrenos nacionais. Por aqui, cumpre-se o objectivo do PSD e de Rangel, quando ontem declarou que "chegou a hora da ruptura com o autêntico buraco negro para onde o País caminha devido às política do Governo PS". Para este efeito, Rangel é um bom candidato. Diremos que se trata de uma continuação das funções que já exerçe.
Ambos os candidatos serão eleitos para o Parlamento Europeu. Um defendendo o seu PS e e uma nova polis europeia. Outro defendendo o seu PSD e a urgente necessidade de tapar o buraco negro da governação socialista. Por alguma razão se chamam a estas eleições as "eleições europeias".

segunda-feira, 13 de abril de 2009

O cizentismo do PSD



Vi o mais recente cartaz de Manuela F. Leite emersa no slogan "política de verdade" na Beira Alta. O sol primaveril daquelas terras não iluminou o cizentismo da peça. Ela cinzenta. O fundo cinzento, ou azul escuro, ou preto, dependendo da distância com que se vê. Olhado mais de perto é cinzento, mais próximo é azul escuro, mais distante é preto. Tal como o partido, mais de perto ou mais de longe não ultrapassa o cizentismo. Acordou tarde para a sua "política de verdade", tal como tarda em apresentar candidatos às próximas eleições europeias. Pelo que se sabe, serão conhecidos no timing definido por Ferreira Leite (FL). Nunca por imposição ou conselho de qualquer "agência criadora de inverdades". A menos de dois meses das eleições europeias pouco ou nada se sabe do que pensa o PSD sobre o assunto. Esperamos para saber...eventualmente no timing de FL. O que sabemos (eu sei...e até posso estar enganado) é que FL acordou tarde para o mundo da comunicação política. Por defeito ou feitio da própria isso pode-lhe ser fatal. A ela e ao partido.


sexta-feira, 3 de abril de 2009

Apelo a todos os "homens civivos"


Assinei a petição promovida pelo Bloco de Esquerda que reclama à democracia portuguesa a exclusão de Domingos Névoa da administração de um empresa municipal com sede algures no Norte. Não é necessário falar da substância do caso (o do julgamento por tentativa de corrupção ao ex-ponta de lança do BE na Câmara Municipal de Lisboa). Sugiro que todos os "homens cívicos" façam o mesmo, em nome da moralidade possível da nossa democracia. Pena é, para mim, que nenhum dos partidos do "arco governativo" tenha tomado a iniciativa. Actuaram tarde (em palavras) e em reacção à excelente iniciativa do BE. Não simpatizo com o Bloco. Mas que faz falta lá isso faz.



quinta-feira, 2 de abril de 2009

Eleições 2009 - vale a pena

Vale a pena seguir o novo espaço da blogosfera sobre o ciclo eleitoral de 2009. Eis uma boa manifestação de "homens cívicos". Afinal existem. Um excelente grupo de analistas do complexo mundo das eleições. Veja-se em http://blogs.publico.pt//eleicoes2009/

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Quantos eleitores somos? os números que não "batem certo"

A recente divulgação dos resultados do recenseamento eleitoral (RE) referentes a 31 de Dezembro de 2008, com base na Lei 47/2008, de 27 de Agosto causaram uma primeira corrente avaliativa (da qual também fiz parte) dos seus efeitos no funcionamento do nosso sistema político. A comunicação social deu eco de alguns efeitos, mas rapidamente esgotou a capacidade analítica de outras consequências. Não sei se para este refreio contribuiu o esclarecimento da Direcção Geral de Administração Eleitoral (DGAI) enviado aos órgãos de comunicação social que referia entre outras razões que:
a) a nova lei foi aprovada por unanimidade;
b) os novos procedimentos levaram à inscrição automática de cerca de 300 mil jovens e de muitos (não se sabe quantos) residentes no estrangeiro;
c) que não se pode comparar o RE com o recenseamento geral da população residente em território nacional;
d) que foram eliminados, desde 1998, cerca de 800 mil eleitores.
Tudo isto culminando com uma referência que titulava de «juíjo político» o dos analistas (onde me incluo pelas declarações que fiz à imprensa) que consideraram que um dos efeitos deste modelo de recenseamento seria o do aumento da abstenção.
Esta matéria merece várias reflexões (que retomaremos). Por hoje fica uma dúvida de fundo. Quantos somos?
Vejamos os números:
  • De acordo com o mapa de eleitores publicado em Diário da República estariam inscritos (vamos utilizar números redondos) 9,7 milhões de eleitores.
  • Consultando os dados do INE, a população residente (RGP) em 2007 é de 10, 6 milhões, sendo a população estimada entre os 0 e os 17 anos de 2 milhões.
  • Logo, o saldo da população eleitora é de 8,6 milhões. Ora se no RE temos 9,7 milhões de eleitores e no INE temos 8,6 milhões, mesmo que retiremos os inscritos nos círculos da emigração (207 mil) temos uma diferença de 890 mil eleitores. Como explicar esta diferença?
A DGAI explica: não se pode comparar o RE com o RGP porque somos um país de emigrantes. Temos que comparar com a população total. Então, pergunto eu, qual é a entidade (oficial e credível) que nos diz qual é a população total? Afinal quantos somos? Ouvi já o número de 15 milhões. Se assim for o problema é maior. Um sistema de recenseamento moderno e certeiro como foi apadrinhado pelo Secretário de Estado da área diz-nos, com verdade, que somos 9,7 milhões de eleitores. Se a população for de 15 milhões, restam 5,3 milhões de jovens portugueses (entre os 0 e os 17 anos) nas nossas fronteiras e nas fronteiras do Mundo. Alguém acredita?
Voltaremos à análise de alguns efeitos das certezas do Secretário de Estado da área.

terça-feira, 31 de março de 2009

Abstenção afecta interesses de Portugal na UE

Surpresa. Ontem, nas suas "Notas Soltas", António Vitorino referiu que as elevadas taxas de abstenção registadas em Portugal nas eleições para o Parlamento Europeu, afectavam a defesa dos nossos interesses na União Europeia.
É verdade que, entre nós, se tem registado uma redução significativa da participação eleitoral nestas eleições (1987-72,4%; 1989-51,2%; 1994-35,5%; 1999-39,9%; 2004-38,6%) e que, por exemplo, nas últimas eleições Portugal registou a oitava (A. Vitorino referiu que foi a quinta) taxa de abstenção mais elevada de entre os 25 países da UE, acima da Eslováquia (16,7%), Polónia (20,4%), Estónia (26%), R.Checa (27,9%), Eslovénia (28,3%), Suécia (37,2%); Hungria (38,4).
As razões que ajudam a explicar os níveis de participação eleitoral dos cidadãos europeus tem sido estudadas e não cabe aqui desenvolver esta matéria. A razão desta nota é a surpresa causada pela correlação estabelecida por António Vitorino entre os níveis de votação dos portugueses e a defesa dos seus interesses na UE. Segundo ele (se bem entendi) quanto menor for a participação menor será a possibilidade de os nossos deputados defenderem os interesses dos portugueses e, julgo, que a regra se aplicaria aos restantes países. Assim sendo, países como o Luxemburgo, a Bélgica e a Itália, defenderão muito melhor os seus interesses (apresentam taxas de participação bastante elevadas) e países como a França, a Alemanha e a Inglaterra (com taxas médias a rondar os 50%) não teriam tais condições.
Como se sabe, não consta que os chamados "países motores da Europa" que se cruzam pontualmente nos famosos eixos tipo "franco-alemão", não defendam os respectivos interesses (e bem) por causa dos elevados níveis de abstenção. Há na argumentação de Vitorino um paradoxo evidente e há, também, a meu ver, uma concepção errada da representação política europeia. Trata-se de uma concepção que faz depender a força das instituições (em particular o P.Europeu) do apoio eleitoral que cada grupo de deputados de cada país recebe. Ora o PE deve constituir-se como um órgão colegial que defende os interesses de todos os cidadãos e não como um conjunto de grupos parlamentares que defende, cada um, os interesses dos seus cidadãos. Talvez esteja neste enviesamento uma das falhas da relação entre as instituições europeias e os cidadãos. E, talvez, este facto ajude a explicar parte do afastamento dos eleitores dessas instituições. Edmund Burke, já alertou os mais atentos para este problema. É sempre bom lê-lo.

segunda-feira, 30 de março de 2009

Partidocracia e independentocracia

Como previsto, o debate sobre o contributo das chamadas candidaturas independentes (em particular nas autarquias) para a melhoria da qualidade da nossa democracia volta à praça mediática com o aproximar das eleições autárquicas de 2009. Hoje o "DN" (Editorial e peça de Paula Sá) aborda o assunto, levantando, a meu ver, duas questões de fundo sobre o tema: 1) haverá espaço para o surgimento de candidaturas genuínas? 2) O fenómeno representa o fim da partidocracia nas autarquias?

Do que conheço do assunto (muito porque o tenho estudado - Meirinho Martins (1997), As eleições autárquicas e o poder dos cidadãos, Vega; Meirinho Martins (2003), participação política e grupos de cidadãos eleitores, um contributo para o estudo da democracia portuguesa, ISCSP; Meirinho Martins (2004), participação política e democracia - o caso português, ISCSP), arrisco a afirmar que não há espaço para a emergência de candidaturas genuínas de cidadãos independentes aos executivos municipais, tal como o fenómeno - o passado e o previsível - não representa o fim da partidocracia nas autarquias.

Há muitas razões que ajudam a compreender a falta de autenticidade do fenómeno: ausência de uma cidadania activa, características do poder local, lógicas de acção dos executivos municipais, etc. Julgo que a causa-mor desta falta de autenticidade prende-se com os efeitos do tradicional fechamento da classe política partidária. Historicamente o poder local foi (e ainda é) espaço de afirmação de micro-partidos (dentro dos partidos), de lideranças -muitas vezes erráticas - que funcionam como lojas de conveniência dos partidos, ao mesmo tempo que essas lideranças foram reforçando o seu capital social e político em terrenos de difícil acesso às máquinas centrais dos partidos. Quando estas máquinas sucumbiram à abertura de novos espaços de competição política (i.e. candidaturas independentes às autarquias), da forma como o fizeram, permitiram que a futura criatura matasse o seu criador. No fundo, os partidos abriram portas aos únicos actores que reúnem condições efectivas de competição local: os seus próprios autarcas. As tentativas de moralização da acção política local ou de renovação interna fizeram o resto. Autarcas com elevado capital político, libertaram-se dos partidos (por exclusão ou por opção própria) e surgem a concorrer, quais "independentes disfarçados" contra os seus criadores. Ora, uma estrutura de oportunidades de participação que é ocupada desta forma deixa muito pouco espaço à emergência de qualquer movimento genuíno de cidadãos. Simplesmente, nenhum movimento desta natureza consegue competir com poderes implantados durante décadas nos espaços locais.

Quanto à segunda questão, há boas razões para prever (como já demonstrado) que este fenómeno (mesmo que genuíno fosse) não representa o fim da partidocracia nas autarquias. É que a realidade já demonstrou o surgimento de uma nova partidocracia: a "independentocracia". Até à data, a larga maioria das candidaturas vencedoras representam uma espécie de partidos sem líder, sem organização, sem hierarquia, sem estrutura, sem fiscalização, mas, nem por isso menos associados aos males da expressão "partidocracia". Se o fenómeno se generalizar, bem podemos assistir (ao nível local) a uma progressiva substituição da democracia de partidos por uma "democracia civil", ocupada por "partidos de um homem só" e que trarão à democracia portuguesa mais males do que remédios.

Voltaremos ao assunto.

sexta-feira, 27 de março de 2009

"Independentes" nas autarquias - entre o taticismo e o disfarçe

Isaltino Morais (em julgamento) e Ferreira Torres (já julgado e ilibado e já triplo candidato à cãmara de MCanavezes) são exemplares da nova espécie de políticos autárquicos com título de "independentes". Em 2001 a lei abriu a possibilidade a candidaturas deste tipo e o resultado é que não veio nada de bom para a democracia portuguesa. As eleiçõe de 2009 estão à porta e a expectativa é que surjam mais candidaturas desta natureza. Mas haverá possibilidade real de candidaturas independentes? Nas investigações que tenho feito sobre o assunto (com incidência na juntas de freguesia), atrevo-me a avançar com a seguinte tipologia (em construçã) que espero viar a testar este ano.
Independentes genuínos: espécie rara... dependem de si e do eleitorado e não se declaram independentes por oposição aos partidos;
Independentes tácticos: têm uma concepção táctica da política e usam o rótulo para valorizar a sua acção como boa, isenta dos pecados e das desgraças dos partidos (defendem a ideologia dos independentes);
Independentes disfarçados: disfarçam-se de independentes uma vez que mantêm uma relação forte com os partidos (são uma espécie de pontas de lança dos partidos, vão e voltam, entregam e recolhem o cartão em função das circunstâncias);
Independento-partidários assumidos: (o nome é impronunciável) assumem as duas condições, respeitam o partido mas querem que o partido respeite a sua independência...pugnam pela sua liberdade mesmo que inscritos e com responsabildiades nos partidos;
Independentes forçados: por força do incómodo que causaram aos aparelhos partidários afastaram-se por força dos seus pecados ou foram convidados gentilmente a sair ou nunca mais foram convidados a ficar;
Dependentes: sujeitam-se às regras dos partidos, seguem as instruções dos líderes, não falam quandoe como querem (mesmo assim não o fazem de forma passiva - partilham de uma dependência moderada);
Hiperdependentes: aceitam o peso e as determinações da máquina partidária que reconhecem como superior comandante dos seus destinos. São acríticos e altamente condicionados pelo colectivo partidário.
Na experiência portuguesa de 2001 (câmaras municipais) mais de metade das candidaturas integraram a categoria de "independentes-forçados" e as restantes incluem-se na categoria de "independentes disfarçados".
Veremos o que aconteçe em 2009. Tenho esperanças de dar utilidade à primeira categoria....

quinta-feira, 26 de março de 2009

Isaltino Morais - Um "homo civicus exemplar"

A fonte oficial é a Agência Lusa. Mas o caso foi hoje amplamente divulgado no "grande meio". Isaltino Morais, um "independente presidente de câmara" forçado que foi a concorrer a tal título por efeito do incómodo que causou ao PSD, declarou no julgamento à sua pessoa que, em 2005, entregou ao Estado o montante excedente dos fundos angariados na campanha eleitoral porque, pasme-se, a «lei a isso obrigava». Mais declarou o "independente presidente" que entre o somatório dos depósitos bancários remetidos para o país do chocolate se contam cerca de 400 mil euros provenientes de «sobras de campanhas» apuradas até 2001, verba que decidiu guardar (para proveito próprio) porque a lei não obrigava à sua devolução (nem ao Estado, nem a ninguém). A surpresa declarativa do "arguido presidente independente"não ficaria por aqui. Eis que aproveita para revelar que a prática de retenção das parcas sobras de verbas das campanhas eleitorais (até 2001) seria generalizada, pois ele - homem bem conhecedor das leis - não conhecia «ninguém que as tenha devolvido». Eis um "homo civicus exemplar", digno de seguir por muitos cidadãos. Um cidadão que tem na lei os seus limites da ética e da responsabilidade. A lei manda: devolvam-se as verbas (se calhar algumas delas disponibilizadas pelo Estado) ao erário público. A lei não manda: fica-se com as verbas para gozo pessoal futuro.
A justificação dada por Isaltino Morais roça a mais elevada indigência democrática no plano da ética pública - para não maçar com outros planos - e prova como um edil (eventualmente exemplar) pode representar um exemplo do pior dos cidadãos. Um exemplo de "homo civicus" a não seguir por ninguém.
PS: as declarações de Isaltino Morais permitem perceber muito do que já sabemos sobre questões do financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais. Eis uma matéria que retomaremos em futuras reflexões civicas.

Primeira entrada

Marcação de estreia neste mundo. Esperamos ter tempo para alimentar o desafio.
Meirinho